quinta-feira, 14 de abril de 2016

"CAI, CAI TANAJURA"


      

                       

Patrimônio imaterial de Tianguá

                 *              
 
Veja o nastro que te puxa,
Agora te achei, sossega!
Vamos já pra Tianguá;
Amansa logo e se entrega,
Pra te pegar distraída,
Custei na penosa lida;
Chegando lá vê se rega!

Vai chuva, mas vê se chega,
Chegando devagarinho
Molha branda aquela terra
Pela qual tenho carinho
Faz com que brote fartura
Aveluda a vida dura
Dessa gente passarinho!
 
Pois lá é que foi meu ninho,
Por isso o carinho é tanto,
Brinquei folguedos alegres
Mas também derramei pranto;
Meu Torrão eu deixei cedo,
Confesso que bateu medo,
Quando cheguei noutro canto!

A vida aqui, eu garanto,
É tão dura o quanto é lá
Trabalhando sol a sol,
Mas inda sou marruá;
Lombo marcado de açoites,
Eu vivo perdendo noites,
O tempo é meu carcará!

           - 01

Vez aqui vez acolá,
Levo algum tombo da vida,
São entreveros ás vezes,
Duma bola dividida;
Quando a bola vai pra o mato
Sou eu quem paga o pato,
Sem ter conta merecida!
 
Com coragem atrevida
E sem ser um demagogo,
Pago pra ver essa briga
Sempre boto a mão no fogo,
Boto a mão em formigueiro
Cachorro brabo trigueiro
Sem regras enfrento o jogo!

Vejam que eu desafogo,
Algumas mágoas, primeiro,
Mais acima fiz metáfora,
Usando um formigueiro;
Vou falar dessa cultura
Que se come tanajura
E Tianguá é useiro!
 
Um lugar hospitaleiro
Que tem suas tradições,
Uma delas cultivada
Até pelo os figurões.
Depois de um simples trato
Tanajura cai no prato,
Pra longas degustações!

           - 02 -
 
Bodega, bar e salões,
Até mercado e na feira
Tem alguém sempre que venda,
A formiga cortadeira;
Ela tem um cheiro forte,
Mas é adendo e suporte,
Nas horas de bebedeira!

Sei que vai pra frigideira
Na culinária local,
Feita de maneira simples
Por vez  n’água e no sal,
Vai um óleo, quando muito,
Não é tempero, o intuito,
É pratica eventual.

Tem, porém, um pessoal,
Cavalgando na vanguarda,
Usa simples alquimia
Com esse invento não tarda;
Socando içá no pilão
Vira paçoca, então,
O prato com nova farda

Tem até gente que guarda
No freezer a tanajura
Garantindo em tempo escasso
Essa gostosa mistura,
Dá o seu jeito e maloca,
Crua ou feito a paçoca...
Assim preserva a cultura!

       - 03 -

“O teu pai tá na gordura”
É refrão de uma cantiga
Que os caçadores cantam
Isto é  moda muito antiga,
Camisa ou palha de milho
Todo mundo no estribilho
Correndo atrás da formiga.

Às vezes até sai briga
No meio da meninada,
Mas de todo esse alvoroço
Quase sempre dá em nada;
Taludos, não homem feito,
Que se acham no direito
De sair dando pancada.

Porém toda essa zoada,
Termina no fim da tarde,
Cada um faz seu balanço
Vantagem conta em alarde,
Uns vão vender a saúva
Outros, porém toma a curva,
Sem que as formigas, guarde.

Agora o céu já encarde,
Coberto com pano escuro
Todo cheio de buraco
Vasa luz por cada furo
O dia então foi simbora,
Vai reinar a lua agora
Com seu clarão nascituro.

         - 04 -

Tem o dia mais de um turno 
E já se foi o primeiro,
Homem mulher e meninos
Deixaram o formigueiro
Carregam os litros cheios
Este é um dos poucos meios
De ganhar algum dinheiro!
 
Mas se chega um forasteiro
E alguém lhe diz: “chega mais”,
“Vem provar desta iguaria”.
O outro diz: “mais rapaz”!
Tu tá ficando maluco¿
Estou velho, e não caduco!
Eu provar isto,  jamais!

Nenhum passo dá pra trás,
Logo no primeiro instante
Pede uma do alambique;
Dando desculpas garante
Que não é um cachaceiro,
Porém sendo um forasteiro,
Não temos um comprovante.

‘Mais uma’. Pede indo avante,
Outra mais daqui a pouco!
Desta vez quer tira-gosto;
Torresmo, pele de porco,
E não tendo o que procura,
Lhe oferecem tanajura,
Mas ele se faz de moco!

     - 05

Come uma e acha pouco
Pede logo uma porção,
Os ‘cabras” que estão presente
Já conhece a reação:
Viram muitos visitantes
Que nos primeiros instantes
Fugiam dizendo não!
 
Mas sempre esse  fujão,
Vira arretado ‘caboco’
Parece até ser de lá
E não enjeita tampouco,
Qualquer outra iguaria
Que encontre na freguesia,
Não quer mais passar, sufoco!

- Agora desce a do coco,
(Nem um pouco capiongo)
Pede o mesmo tira-gosto,
Co’a língua feito um mondrongo,
Mas tem um “cabra” do lado
Com mumganguice, o safado,
Que lhe dá é sorondongo!

Vou parar e não prolongo,
Não tem muita explicação;
O sorondongo é do coco,
A tanajura é do chão.
Essa primeira iguaria
Dessa estrofe eu diria
Que só vi no meu rincão!

           - 06 -         

Digo aqui também então
Que se desmancha em gordura
Tem formato de lagarta
Difere da tanajura,
Igual ao coco ele é branco,
Porém, amigo eu sou franco,
ó comi feito em fritura!

Eu prefiro a tanajura
Exótica e saborosa
Que nas águas de janeiro,
Tem viagem perigosa;
Sendo alada esta formiga,
Sai voando sem fadiga
Naquele sol toda prosa!

Naquela terra rochosa,
As que conseguem pousar,
Formarão mais formigueiros,
Pra espécie eternizar,
Porém as capturadas,
Em petiscos, são viradas,
Vão parar em algum bar!
 
Digo também que no lar,
Na panela ou frigideira,
Elas farão a alegria,
Daquela família inteira,
Quando não em comilanças,
Sendo ‘intera’ nas finanças
Para que melhore a feira!                 

            - 7 -

É festejo é brincadeira
Para toda a meninada.
Tomando banho de chuva
Com o sol vão pra caçada
Essa festa a céu aberto
Poe a natura mais perto
De tanta gente animada!

Se tiver reima, tem nada,
O corte da cortadeira,
Só o adulto tem medo,
Faço ideia, isso é besteira;
Com bota, luva ou lata,
A formiga não maltrata,
Se fizer: sai na carreira!

João Bosco na sua cadeira,
Com projeto cultural
Tornou nossa tanajura
Um bem imaterial,
E agora Tianguá
Orgulha-se da içá
Com seu voo nupcial!
 
Zelo patrimonial
É o que tens conterrâneo.  
Sem artificialismo
Agiu de jeito espontâneo,
Longe estando só aplaudo,
Vendo um grande e belo saldo
Assim ser contemporâneo.
Do amor que é simultâneo
Ousar ter o mesmo brilho
Reservado a teu filho!

Zé Salvador.

São Gonçalo,  06\03\2016

 

             

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 






             
 

 

 

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